Sunday, December 16, 2007

"Agora vou falar da dolencia das flores para sentir mais a ordem do que existe.Antes te dou com prazer o néctar, suco doce que muitas flores contém e que os insetos buscam com avidez.Pistilo é o orgão feminino da flor que geralmente ocupa o centro e contém o rudimento da semente.Pólen é pó fecundante produzido nos estames e contido nas anteras.Estame é o orgão masculino da flor.É composto por estilete e pela antera na parte inferior contornando o pistilo.Fecundação é a união de dois elementos de geração - masculino e feminino - da qual resulta o fruto fértil.
“E plantou Javé Deus um jardim no Éden que fica no Oriente e colocou nele o homem que formara”(Gen.11-8)
Quero pintar uma rosa.
Rosa é flor feminina que se dá toda e tanto que para ela só resta alegria de se ter dado.Seu perfume é mistério doido.Quando profundamente aspirada toca no fundo íntimo do coração e deixa o interior do corpo inteiro perfumado.O modo de ela se abrir em mulher é belíssimo.As pétalas tem gosto bom na boca - é só experimentar.Mas a rosa não é it.É ela.As encarnadas são de grande sensualidade.As brancas são a paz do Deus.É muito raro encontrar na casa de flores rosas brancas.As amarelas são de um alarme alegre.As cor de rosa são em geral mais carnudas e tem a cor por excelência.As alaranjadas são produto de enxerto e são sexualmente atraentes.
Preste atenção e é um favor: estou convidando voce a mudar-se para um reino novo.
Já o cravo tem uma agressividade que vem de certa iritação.São ásperas e arrebitadas as pontas de suas pétalas.O perfume do cravo é de algum modo mortal.Os cravos vermelhos berram em violenta beleza.
Os brancos lembram o caixão de criança defunta: o cheiro então se torna pungente e a gente desvia a cabeça para o lado com horror.Como transplantar o cravo para a tela?O girassol é o grande filho do sol. Tanto que sabe virar sua enorme corola para o lado de quem o criou.Não importa se é pai ou mãe .Não sei. Será o girassol flor feminina ou masculina? Acho que é masculina.
A violeta é introvertida e sua introspecção é profunda.Dizem que se esconde por modéstia.Não é.Esconde-se para poder captar o próprio segredo.Seu quase-não-perfume é glória abafada mas exige da gente queo busque.Não grita nunca seu perume.Violeta diz levezas que não se podem dizer.A sempre-viva é sempre morta. Sua secura tende à eternidade. O nome em grego quer dizer: sol de ouro.
A margarida é florzinha alegre.É simples e à tona da pele.Só tem uma camada de pétalas. O centro é uma brincadeira infantil.A formosa orquídea é exquise e antipática.Não é expontânea.Requer redoma.Mas é mulher esplendorosa e isto não se pode negar..Também não se pode negar que é nobre porque é epífita.Epífitas nascem sobre outras plantas sem contudo tirar delas a nutrição.Estava mentindo quando disse que era antipática.Adoro orquídeas.Já nascem artificiais, já nascem arte.
Tulipa só é tulipa na Holanda.Uma única tulipa simplesmente não é.Precisa de campo aberto para ser.
Flor dos trigais só dá no meio do trigo.Na sua humildade tem a ousadia de aparecer em diversas formas e cores.A flor do trigal é bíblica.Nos presépios da Espanha não se separa os ramos de trigo.É um pequeno coração batendo.
Mas angélica é perigosa.Tem perfume de capela.Traz êxtase.Lembra a hóstia.Muitos tem vontade de come-la e encher a boca com o intenso cheiro sagrado.
O jasmim é dos namorados.Dá vontade de por reticências agora.Eles andam de mãos dadas, balançando os braços, e se dão beijos suaves ao quase som odorante do jardim.Estrelícia é masculina por excelência. Tem uma agressividade de amor e de sadio orgulho.Parece ter crista de galo e o seu canto.Só que não espera pela aurora.A violencia de tua beleza.
Dama-da-noite tem perfume de lua cheia.É fantasmagórica e um pouco assustadora e é para quem ama o perigo.Só sai de noite com seu cheiro tonteador.Dama-da-noite é silente.
E também da esquina deserta e em trevas e dos jardins de casas de luzes apagadas e janelas fechadas.
É perigosíssima: é um assobio no escuro, o que ninguém aguenta.Mas eu aguento porque amo o perigo.Quanto à suculenta flor de cáctus, é grande e cheirosa e de cor brilhante.É a vingança sumarenta que faz a planta desértica.É o explendor nascendo da esterelidade despótica.
Estou com preguiça de falar da edelvais.É que se encontra à altura de tres mil e quatrocentros metros de altitude.É branca e lanosa.Raramente alcançável: é a aspiração.Gerânio é flor de canteiro de janela.Encontra-se em São Paulo no bairro do Grajaú e na Suiça.Vitória-régia está no Jardim Botânico do Rio de Janeiro.Enorme até quase dois metros de diametro.Aquáticas, é de se morrer delas.Elas são o amazônico:o dinossauro das flores.Espalham grande tranquilidade.
A um tempo majestosas e simples.E apesar de viverem no nível das águas elas dão sombras.Isto que estou te escrevendo é em latim:de natura florum.Depois te mostrarei o meu estudo já transformado em desenho linear.
O crisântemo é de alegria profunda. Fala através da cor e do despenteado. É flor que descabeladamente controla a própria selvageria.
Acho que vou ter que pedir licença para morrer.Mas não posso, é tarde demais.Ouvi o Pássaro de Fogo - e afoguei-me inteira.
Tenho que interromper porque - eu não disse? eu não disse que um dia ia me acontecer uma coisa? Pois aconteceu agora mesmo.”

Clarice Lispector em Água Viva.

Thursday, September 27, 2007

O que viria a ser a felicidade?
Acordar pela manhã, olhar o sol pela janela e não encontrar sentido no fato de ter acordado sugando ar pelas narinas?
Pegar ônibus lotado de sonhos desperdiçados, deixados de lado por falta de tempo, coragem e poesia?
Levar repreensão porque não conseguiu ser o melhor profissional do mundo hoje, pelo simples fato de você não estar conseguindo nem ao menos ser seu melhor amigo?
Ter que chorar escondido no banheiro pra não demonstrar fraqueza e falta de crença na vida?
Sentir saudades de carinhos verdadeiros e singelas, porém singulares demonstrações de afeto que se foram e que nunca mais vão voltar?
Voltar pra casa enfrentando os mesmos sonhos deixados de lado estampados de tristeza nos rostos que me acompanham nessa viagem de volta ao nada onde vivo?
Afinal, o que viria a ser a felicidade?
Um ciclo interminável onde os protagonistas nunca chegam ao feliz.
Eis a lei da vida, da vida real, da vida vivida, da vida em fomos jogados sem o direito de escolhermos se queríamos viver ou não.
Vivamos a felicidade então, se é que ela existe.

Saturday, August 11, 2007

Há alguns meses atrás, eu cheguei à triste conclusão de como o vazio, o abandono e as despedidas doíam. E por semanas a fio esse vazio enorme me corroeu a alma. E eu sofri, chorei e doí. Tudo que tinha para doer. A cadeira já não balança como antes, o perfume passou a ser apenas um frasco com líquido colorido e cheiroso, as roupas viraram centímetros de tecidos costurados com linhas de saudade.
Saudade.
Sempre me disseram que o melhor e mais duro remédio para tudo era o tempo. Sempre ouvi isso. E eu sempre pensei que era a maior história de quem não tinha cara de resolver as coisas. Mas, nesses mesmos alguns meses, eu descobri que o tempo era a maior das verdades. E com esse mesmo tempo, os laços que eu possuía, e que foram demoradamente amarrados e apertados a quatro mãos, foram sendo desfeitos, como se fossem frágeis e efêmeros. E eu que pensei que eram tão fortes, que chegavam a sufocar, sucumbiram com esse mesmo remédio, o tempo.
Fragilidade.
Então, depois desses alguns meses, descobri que o tempo me tornou livre. De tudo. De mim. Dos outros. E hoje, a tristeza, a saudade e a felicidade estão comigo. E estão de uma forma plena, de uma forma que eu aprendi a construir, por um sentimento que eu aprendi a sentir.
Liberdade.
Há alguns meses eu decidi pegar uma das minhas mochilas enormes e encher de lembranças, sorrisos, segurança, carinho e amizades. Guardei-a junto com as fotos, os cartões antigos e meu senso de humanidade. Comigo, hoje, carrego apenas os melhores amigos. Mas os de verdade. E eles são felizes comigo e eu amo estar com eles. Tipo crianças, os sorrisos são sempre verdadeiros e os abraços são sempre os mais sinceros. E, com eles, entro numa atmosfera única, criada por todos esses risos, abraços, salgados e doces ao fim das tardes.
Magia.
Nesses alguns meses eu acabei vendo como sou muitos dentro de um só. Filho, pai, namorado, amigo, ouvinte, protagonista, coadjuvante, até mesmo figurante deixado pra trás. E sempre retorno ao ponto de partida, um roteiro gasto, batido, que já sei como será o fim. Eu faço cinema. Multiplicidade.
Há alguns meses, eu disse que o vazio estava doendo. Hoje, aprendi a conviver com o eco de uma casa e um coração vazios, e esse eco não dói mais.
Anestesia.
Hoje, amanhã, depois de amanhã, semana que vem... eu deixo gradativamente o mundo pra trás, em busca do colo que perdi, dos sorrisos que não dei, dos afagos no cabelo que não recebi. O mundo vai se tornando uma enorme bola azul que aprecio lá de cima, sem hesitar em estar indo embora ao encontro do que eu realmente conheço, o Desconhecido. Levo apenas minha mochila com salgados, amigos de doces e amargas confissões e um coração casando de voar baixo, ansioso por um universo que o espera.
Coragem.
Hoje, deixo esse planeta vazio pra trás.

Saturday, July 28, 2007

Era domingo. Ela acordou e olhou pela fresta da porta. Notou que o dia já estava claro, pois os poucos raios de luz que passavam por debaixo dela iam de encontro ao seu rosto pálido e assustado, e não encontrara ninguém sentado na cadeira que jazia há dias ao lado da sua cama. O antigo relógio sobre o criadomudo marcava nove horas e trinta e cinco minutos, e ecoava um cântico síncrono de encontro gradativo com a morte, conforme os segundos iam ficando para trás. O lenço branco, sujo de sangue por conta da tosse que tomara conta daquele quarto a noite toda, estava no chão, e foi apanhado pelas mãos pequenas, brancas e ainda trêmulas, sentindo a falta de alimento. E não era só seu corpo que estava faminto, sua alma ansiava por alimentar-se, talvez de algo que nem ela mesma sabia o que era.

Abriu a porta e, ao chegar na sala mal iluminada e com cheiro de mofo, deparou-se com a mãe sentada numa cadeira de rodas, ligada a aparelhos para respirar. Um cárcere sem paredes nem grades, onde todos os dias ocorriam inúmeras batalhas contra ela mesma. Os olhos daquela mulher refletiam um mundo distante, pra onde sua alma havia fugido, mundo esse talvez bem próximo do seu. Sim, imersa naquela morbidez, pode ver que a tuberculose que se hospedara nos seus pulmões não era nada diante do abismo de onde sua mãe conseguia sair todos os dias, fugindo daquele câncer que devorava seus pulmões.

Aproximou-se da mãe e acariciou-lhe os cabelos macios, esbranquiçados. Fechou os olhos e sentiu-se envolvida por uma mística penumbra de afeto, como jamais sentira. Seu corpo se sentia amado, aquecido, forte, vivo, a ponto de expelir um tímido sorriso. Minutos de surrealismo e contentamento que foram interrompidos por um suspiro (talvez o último) da mãe que ali recebia amor, como nunca recebera a vida inteira.

Seus olhos, agora fixos no nada, nada diziam, a não ser um adeus saudoso.

A menina precisava agora ser forte, como nunca havia sido antes. Precisava esquecer as fragilidades do seu corpo e da sua alma e dedicar o restante de saúde que ainda tinha àquela que tanto fez por ela. Mas por que era tão difícil pra ela fazer tudo isso? Ela havia se acostumado ao convívio com o mórbido, como se a felicidade fosse algo estranho? Algo que nem ela mesma sabia o que era.

Sentia-se abandonada pela vida e por todos que passaram por ela e prometeram ficar, mas não suportaram o cotidiano cinza-escuro que preenchia seus segundos, marcados pelo relógio antigo sobre o criadomudo. Por que abadonaram-na? Algo que nem ela mesma sabia o que era.

Ocorre que aquela manhã sombria de domingo foi como a estação onde, marcado pelo antigo relógio sobre o criadomudo, o tempo se fez imperdoável e aquela menina viu suas últimas doses de amor dobrarem a curva da estrada.

Friday, July 20, 2007

Como você acordou hoje? De mau humor? Já deu um beijo de bom dia, boa tarde ou até mesmo boa noite na sua mãe e disse que a amava? Não? Pois deixa eu te contar uma história...
Tem gente que daria tudo pra fazer isso nesse momento e, por algum motivo, não pode mais... A saudade continua entrando no coração feito um espinho de laranjeira, daquela que a gente colhia laranjas pra fazer suco pro jantar.
Dia 24 faz um mês que ela se foi. Mas parece que foi ontem. E talvez assim vai ser o tempo que passar. As fotos, os vestidos, a cozinha, o ar que ela respirava.. tudo me traz lembranças de momentos que agora vêm à tona, acrescentando mais uma colher de saudade nessa receita que amarga na boca.
Um conselho: Ame seus pais. Abrace, beije, sente no colo, acorde e, logo de manhã, diga que ama, acompanhado de um beijo caloroso. Um dia, tudo isso será reduzido a um desejo impossível de se realizar, que será acompanhado de uma lágrima de impotência e dor.


Mãe, onde você estiver, eu te amo.

Wednesday, June 20, 2007

Abraçou-o com toda a sua intensidade. Seu coração batia forte e seu corpo tremia, evidencando seu nervosismo e a importância daquele momento para ela. Ele não pôde deixar de sentir seu pulsar forte e viu o quanto o nervosismo a atingia. Sentiu-se confortada, amada, desejada, feliz por alguns instantes. Seu coração se aqueceu, se encheu de um sentimento nobre, que contagiou sua alma em alguns instantes... seria vida?

Ela pediu para aqueles momentos não terminarem jamais... Mas o tempo não perdoa. Ele se foi. ficou apenas o cheiro, o gosto, a lembrança daqueles minutos únicos. Sorria desesperadamente, sem saber por que estava sorrindo. Achava-se estranha, bizarra por estar feliz. Como podia?

Precisava se olhar, ver o brilho que se hospedara em seus olhos! Correu para diante do espelho mais próximo. Impressionante, logo o espelho, de quem ela sempre fugira... Era verdade. Seus olhos pareciam duas velas que voltaram a acender-se, cheias de esperança e vigor... ela estava viva!

Voltou ao encontro do seu amigo e, no caminho de volta, viu o ser que pusera o brilho em seus olhos depositando o mesmo brilho nos olhos de outro. Nesse instante, a chama, que até então se mantivera viva, estava se apagando, talvez porque tenha sido molhada com a tímida lágrima que caiu dos olhos, agora já apagados. Percebeu que mais uma vez caíra nos sonhos vãos de sua eterna carência e da sua inocência boba. O mundo não a ama. A vida não esquece de lhe dar seu sofrimento diário. O destino a quer seca, sozinha, falecendo aos poucos no seu mundo imaginário, bizarro, escuro, frio, sujo, de onde ela nunca vai sair.

Todas as coisas boas que ela sentiu por alguns instantes, alguns minutos, alguns segundos, todo o encanto, toda a cor, toda a vida, saltaram dos seus olhos e tomaram de conta do outro ser, felizardo, escolhido, especial. Sentiu seu coração chorar. Mas, o que poderia fazer pelo seu coração, se ela mesma estava chorando e morrendo aos poucos? Restava deixar tudo aquilo para trás e partir de volta para seu mundo imaginário, bizarro, assustador.

Monday, June 11, 2007

Ele a abraçou com toda a força do seu desejo. Sua pele ardia, implorava por algo mais. Ela, embriagada pelas lembranças e fantasmas do passado, simplesmente deixou-se abraçar, indiferente, embora seu corpo estivesse ardendo em meio àquelas gotas de desejo que tocavam sua pele. Sentiu seu corpo tremer ao sentir aquelas mãos grandes e firmes a abraçarem. A lua, imponente, saia de dentro do mar como uma mãe da a luz ao seu filho e, aos poucos, ia tecendo nas águas uma trilha prateada. A lua sempre a encantava.

Sentiu-se desejada, cobiçada, inatingível, inalcançável. Ela, assim como a lua, tornara-se causadora de suspiros. Mas os tais fantasmas insistiam em assombrá-la. Por que? Como pode alguém que nesse instante está tão distante atormentar seu mundo a ponto de tornar aquele momento tão sublime um pesadelo tão assustador quanto aos que tinha quando criança? Ela buscava respostas para essas questões, talvez até mesmo para o motivo de sua existência, enquanto ele continuava a conhecê-la como ninguém o havia feito, imerso em um poço de sensações.

Sim, seu corpo ardia como madeira plenamente acesa, que abrasava conforme o vento frio vindo do mar a tocava. Mas seu espírito não estava ali. Voara para longe, ao encontro do homem que se tornara dono dos seus sonhos, das suas noites, das suas lágrimas. Seu corpo, naquele momento, pertencia àquele ser cheio de libido, ardente em desejo, mas sua alma estava selada, trancada em um universo de onde jamais sairia, a não ser ao encontro de seu dono.

Nesse instante, perguntou-se porque se sentia assim. Como podia ela esperar e até mesmo entregar sua eternidade a um ser que jamais conheceria? Talvez ela jamais encontrasse respostas às suas indagações, a não ser as tímidas lágrimas que caíram, como uma fonte que nascia no mundo imaginário onde se escondia sua alma. Como resposta à pergunta feita pelo ser ardente em desejo que a possuíra como um faminto devora um pedaço de pão, um momento de silêncio. Um olhar fixo na trilha prateada, desenhada pela lua imponente sobre as águas profundas, infinitas, misteriosas, por onde ela sempre desejou caminhar, rumo a um destino desconhecido, como a mulher ali deitada. Sim, a lua sempre a encantava.

Friday, June 8, 2007

Noite quente, calor, suspiros, lembranças. A lua resolve se esconder, numa tentativa de se esquivar do testemunho da sofreguidão humana, e o vento soprar por sobre as águas do mar, distantes dali. Uma mistura de bucolismo e melancolia. No quarto, ali está ela, a esperar as palavras certas, como uma criança anseia um presente no Natal. O papel em branco à sua frente, pronto para receber o vendaval de sentimentos que está preste a sair.

Ao fundo, o rádio cansado de libertar palavras bonitas e, talvez, de escutar, sempre silencioso, seus sussurros agoniados em direção ao nada que inundam seu universo de quatro paredes. Ou talvez, quem sabe, seu universo fosse bem maior do que aquele resumido cárcere de portas abertas? Há flores em tudo o que vejo. Perguntas.

Aos poucos, o universo branco, até então intocado, foi-se preenchendo com amores, ódios, rancores, prazeres, em um ritual sublime no qual tudo parecia síncrono, onde as palavras dançavam ao som da gasta caneta, impelida pela mão delicada, que ostenta a amarga medalha da melancolia nas cicatrizes nos pulsos.

O papel estava, finalmente, repleto de flores, das suas flores. Mas flores de plástico não morrem! Por que, então, as suas estavam morrendo? Para quem ela escrevia? Perguntas.

Flores têm cheiro de morte, e são mais perfumadas quando estão morrendo, pensou. Estaria ela, então morrendo? Isso porque flores morrem para que outras nasçam, talvez mais bonitas. Sim, o papel, agora vermelho-sangue, exalava o suave perfume da morte. Flores de plástico renascem? Perguntas.

Wednesday, June 6, 2007

SETE ANDARES

Aqui, na varanda da minha casa, observo a noite se aproximar de forma tímida, mas sempre sublime e imponente, com seu ar saudoso, arrastando pelo céu seus longos cabelos negros ornamentados com estrelas, numa cerimônia cotidiana de embelezamento e mistificação.

Com ela, chegam os receios e autodesprezos costumeiros que insistem em assombrar cada vão deste meu mundo. Lá embaixo, a cidade começa a se iluminar. Os carros, cheios de fúria, acendem seus faróis, como tochas de fogo incendiando as ruas, numa batalha sangrenta que se repete todos os dias.

Descendo três quarteirões da rua, ouço as ondas quebrando nas pedras e logo me vem às narinas o cheiro do mar, o único vestígio de natureza que encontro ao observar o que circunda meu castelo de concreto que fica a sete andares de altura.

Encontro-me sozinha, sepultada a sete andares, sete chaves, sete palmos. Comigo, foram selados todo o vigor e vanguardismo que um dia tomaram conta deste túmulo que fica mais perto do céu. Sim, estou sete vezes mais perto do céu do que todos os vivos.

Aqui, o silêncio reina absoluto como um ditador implacável, e seu autoritarismo só é quebrado com o desespero das buzinas dos carros, o movimento contínuo das ondas sobre as pedras e a morbidez dos meus pensamentos. Talvez este último seja o mais transgressor e mais incômodo dos revolucionários.

Levanto os olhos e vejo na floresta de prédios que me cerca muitos outros pontos de luz nas janelas ao longe. Será que, como eu, existem mais sepultados que parasitam um pouco da vida e do cheiro de caos que invadem suas lápides? Será que o desejo de fugir deste cemitério gigantesco e voar em direção ao desconhecido também lateja em suas mentes? Minhas interrogações são maiores que minhas ações.

Aqui, na varanda da minha casa, a sete andares, sete palmos, sete chaves, sete dias, assisto, inerte, o espetáculo repetitivo que tem a vida como protagonista, a qual deserda de felicidade a tantos quanto eu anseiam ter asas, para, finalmente, abandonar o cárcere de pedra onde estão aprisionados.

Sunday, June 3, 2007

A Cerejeira

Dia letárgico, onde muito se tem a fazer e pouco se quer...
Rsolvi então postar um texto meio antigo que escrevi, mas extremamente cíclico, que vez ou outra me define perfeitamente [como hoje].

A CEREJEIRA

Aos pés da grande cerejeira, ela já sorriu, chorou, sonhou, planejou, amou, odiou, numa quimera perfeita, açulada pelo vento do fim da tarde, que acaricia seus cabelos longos e negros e leva consigo as folhas secas e as flores com cheiro de lágrima. Um altar inviolável, onde repousam suas memórias e estão enterradas suas aspirações, que é contemplado como uma sinfonia com ar funesto.

Aos pés da grande cerejeira, ela deitou na grama e sentiu a umidade da terra tocar sua pele descorada. Sentiu vida! Talvez fosse a sua vida, ali muitas vezes deixada. Sim, aquilo era vida! Aquele lugar, como tantas outras vezes, oferecia às suas enfermidades um elixir divinal, capaz de transformar as úlceras em cicatrizes, tais quais as marcas de canivete estampadas no tronco da grande cerejeira. Nisso, elas tinham muito em comum.

Hoje, aos pés da grande cerejeira, ela se despiu de si e se vestiu da luz do fim da tarde, que driblava os galhos das árvores e tocava seu rosto, num singular ritual de magia branca, que tinha como louvor sacro o canto do casal de pássaros que ali pousara. Uma canção terna, maternal, que só ela compreendia, como na sua época de criança, quando passava as tardes ali, deitada, sonhando com o dia em que voaria para longe. Sua seiva corria por entre as veias conforme seu coração pulsava, e isso a tornava humana.

Ali, aos pés da grande cerejeira, ela se sente voltando ao útero para, mais uma vez, brotar do chão num ato milagroso de regeneração. Por que ela se sente assim? Não se sabe. Uma tentativa de entrar, mais uma vez, em seu esplendoroso mundo imaginário? Talvez. Importa que, hoje, ao levantar da grama e voltar para casa, ela trouxe consigo um embrião de contentamento, um acanhado sorriso e uma paisagem que só ali ela encontra.


Saturday, June 2, 2007

I Love Funk - FMF 2007

"...o desfile dos estudantes do curso de Estilismo e Moda da UFC Marleudo Costa e Natália Azevedo veio carregado de irreverência, criatividade e muita, muita cor, abrilhantando o último dia de desfiles da 26ª edição do FMF. Misturas de estampas e padronagens deram um ar descontraído aos looks, embalados por um funk "americanizado", num ar 'Barbie vai ao pancadão', como o próprio estudante definiu. Compondo os looks, acessórios hipercoloridos, num mix de tons cítricos e quentes. Minicoroas ainda foram uma constante na passarela. Tudo pra mostrar que funk pode ser glamour sim! Sem dúvida o melhor desfile da noite. A dupla promete nos próximos capítulos no cenário fashionista local..."


Bom, esse foi um dos muitos comentários positivos acerca do nosso último trabalho... Fico muito feliz com o retorno positivo de tanto trabalho e dedicação. Sucesso a vocês.
E, quanto aos que não gostaram, fico feliz por vocês também existirem, pois é com as críticas que vocês nos dedicam que aperfeiçoamos nosso trabalho. Sucesso a vocês também.
Beijos a todos e um ótimo fim de semana.